LXX

E ali,
no meu caminho,
bem à minha frente,
havia um mundo.
De água tão pura,
tão clara,
que resolvi dela me banhar
e saciar minha sede.
Um mundo de terra tão fértil,
que nele semeei meus sonhos
e colhi o sentido da vida.
Um mundo tão leve de se respirar,
tão cheiroso...
Um mundo de fogo
onde arde a carne só em pensar.
Não sei como não chorar
ao me lembrar daquele mundo.
Lembranças que transcendem,
umedecem minha pele,
tiram-me o ar,
lembranças daquele olhar.
Saudade dia, saudade noite,
saudade mente, saudade corpo...
Quero beijar tua testa,
cheirar teu cabelo,
encostar teu rosto em meu colo,
cobrir tuas costas
e falar ao teu ouvido
o quanto te quero bem.
Quero segurar tuas mãos,
e olhar nos teus olhos,
bem dentro dos teus olhos,
quando nada mais me restar,
pra despedir-me sorrindo
a confirmar que,
enfim,
vali a pena.
Quero deixar-te a lembrança
de todas as vezes em que o afaguei,
dos sorrisos que em mim desabrocharam
só por ti,
dos gemidos que me escaparam
por puro prazer.
Quero deixar-te a herança
das cores,
dos aromas,
das formas,
das descobertas que foram só minhas
por serem tão intimamente tuas,
ao percebê-las em teus gestos,
em tua crença,
por meio da tua fé.
Quero que sonhes
com meu corpo ainda jovem,
com meus cabelos ainda negros,
com nossas pegadas na areia daquela praia,
naquela ensolarada manhã de domingo,
ao nascer de mais uma primavera.
Minha imagem não corresponde ao início,
mas minha alma é só divindade
ao transbordar por ti.
Deixa-me cheirar
a palma da tua mão direita,
e conduzi-la ao meu rosto fascinado.
Caso encontres lágrimas em meus olhos,
leve-as aos teus lábios
que nelas encontrarás o sal do mar,
pra temperar a tua vida,
sempre,
pra sempre,
com amor.