Ao longe avistei um leão albino! Espreitava ele uma delicada perdiz, não menos branca, entre porções de ilhas flutuantes naquela imensidão de céu. Feriam os dois a vista, refletindo a intensa luz do Sol. Daqui a pouco, sumiram numa bruma intensa ao som de Vivaldi e, então, tudo tremeu! O medo voltou, segurei novamente a sua mão.
Detive-me a pensar, no quanto mais forte é você que o leão.
Imaginei como seria a luta entre um touro moreno e um leão albino àquela luz da manhã, bem debaixo de um
arco-íris, tendo o touro, São Jorge à sua guarda.
E a perdiz espiando desconfiada e só, naquela imensidão não menos solitária, amedrontadora e intensamente pacífica, eterna, divina!
A bruma envolveu tudo e, então, já não os vejo mais.
Ouço Clair de Lune e me lembro de nós dois, do mar da Bahia e de você cantando pra mim sob o clarão da Lua.
Aspiro a força daquelas cores e tons, daquele som e de todos os nossos sons e dos sentimentos que envolvem as lembranças que o trazem a mim... Inspiro-me de você.
Seguro ainda a sua mão esquerda, protegida ainda, por aqueles três nós bentos. Quanta saudade! Sabe, a sua mão nunca se separa da minha, assim como o seu cheiro que vem de mim, de dentro pra fora. E vai e volta, vai e volta, vai e volta... Adoro esse mimo!
Não consigo testemunhar essa luta sem chorar. É verdadeiramente dramática e emocionante!
No momento seguinte, Villa-Lobos acorda o meu corpo, provoca as minhas memórias, desafia-me e carrega consigo toda a bruma... Ela, a bruma, se vai e você fica,
está cravado em minha carne.
Amo-o impiedosamente, imensurável como as forças do touro e do leão.
Guardo só pra você a delicadeza da perdiz, a sensualidade das bachianas, a umidade da bruma, o calor do Sol, a luz da manhã e o clarão da nossa Lua.
A minha alma e o meu corpo o aguardam simultâneos e inseparáveis, em qualquer dimensão.
Voar, ver tudo de cima, não exclui o mergulho.
E o mergulho é tudo!
O mergulho é o todo!
Vem cá, dê-me a sua mão...