XXXVI

Talvez eu devesse mas não há como.
Procuro rimas e já não as encontro.
Talvez nem devesse escrever, apenas sentir. Mas se escrevo, em sua presença, reservo-me apenas ao sentir. E como isso é bom!
Estou em meio à, ao centro, no olho do furacão... Fui tragada!
Minhas lembranças cor de carne e vinho são quentes, úmidas, envolventes, perfumadas, permissivas... São como tangos de Piazzolla: dramáticos, densos, sensuais, libertinos e libertários.
Estou à mercê de um desejo incalculavelmente passional, atormentado e devastador como o desejo de loba faminta cheirando carne fresca na escuridão, pressentindo, espreitando e que, de posse da presa, sem perdão, abocanha, rasga, devora, apenas por tudo isso lhe ser tão natural. Só então uiva pra Lua, saciada!
Vê? Eu também não tenho pena, não tenho dó, tenho apenas fome, muita fome! E uma saudade constante, profunda, perfumada, misteriosa, amorosa, de sonhos, de procura, espera e entrega... Sempre.
Talvez eu devesse, mas não há como.
Procuro calmaria em tempestade mas, evidentemente, não encontro, nunca mais encontrarei!
Meu coração não sossega, meu corpo não dá trégua, meu espírito se inquieta. Meu cérebro conjuga constantemente o verbo lembrar: eu me lembrei, eu me lembro, eu me lembrarei até o último momento da minha vida.
Quero-o junto ao meu seio, em meio ao meu colo, desejo-o sob o meu ventre, ofereço-me ao seu doce, curioso, sensual e provocativo olhar.
Setembro chegou e quando a primeira chuva cair, sentirei o cheiro da terra molhada e, novamente, minha primeira vontade será você. Vontade mais que de céu, de ar, de mar, de Deus, pois Deus é o Encontro e você é o meu Encontro, a minha primavera. É assim que Ele se manifesta em mim.
A minha alma está repleta...